Aqui e agora, neste pedaço de rocha ainda sem nome, entrego a minha candidatura solene ao homem da barca. Ele que me empurre gentilmente pelas margens serenas do rio celeste, que me lave abençoadamente com as mãos àsperas de quem purifica a alma encardida pela rigidez dos meus pecados infames, em legítima defesa. As serpentes enrolam-se na minha cruz corporal, como os grilhões de um messias acorrentado na última tábua do cadafalso, quase a estalar com o tombo no infinito da libertação eterna.
E encaro a sentença de morte dos teus olhos justos de braços abertos, um joguete à mercê dos desígnios da tua vontade sábia, este teu servo readmitido permanentemente no turno da noite. Já sinto o soluço da pele a afogar-se na salina purgante da transição etérea, o ensaio da cegueira muda que engole os homens de deus, a dormência dos sentidos adquiridos pelo cobrador de impostos do segundo mundo.
O meu titã já desceu o derradeiro degrau terrestre e desenterrou o túmulo de flores da verdade proibida. Não existe mais nada a temer, meu amor! Podem embalar o frasco do meu espírito para a tua morada, que lá estarei a partir de hoje e para sempre. O destino tentou apunhalar-me pelas costas como uma farpa cobarde, mas eu agigantei-me perante a sua sombra divina, além do limite racional do somatório de todas as forças combinadas do meu ser. Chegou finalmente a hora gloriosa de me imortalizar na Taprobana dos meus amores, lúcido e desconectado daquele videojogo esquizofrénico da minha sobrevivência mental.
Adeus mundo! Esta é a minha Última Transmissão Humana...
Autor da imagem: Tiago Xavier Em http://tiagoxavier.pt
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